Quarta, 25 de outubro de 2023
Apenas 35,7% dos trabalhadores por meio de aplicativos de serviço contribuíram para algum instituto de previdência em 2022, ante 60,8% na média dos trabalhadores do setor privado, mostra uma pesquisa inédita do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O levantamento é um módulo especial da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua chamado Teletrabalho e trabalho por meio de plataformas digitais, que busca mapear o fenômeno do trabalho por aplicativo no país e mostrar a extensão da dependência desses trabalhadores às plataformas.
Ao todo, apenas 532 mil dos 1,49 milhão de trabalhadores por meio de plataformas digitais no país estavam assegurados por instituto de previdência no ano passado. A contribuição garante não apenas o direito à aposentadoria, como a seguro-doença e licença-maternidade, por exemplo.
“O que a gente vê é que mais de 60% das pessoas que trabalhavam por meio de aplicativos de serviços não estavam asseguradas por instituto de previdência social, enquanto no total de trabalhadores a parcela é inferior a 40%”, diz Gustavo Geoquinto Fontes, responsável pela pesquisa.
Os dados do IBGE mostram que há uma desigualdade regional nessa proteção previdenciária. Enquanto no Sul do país metade (50,1%) dos trabalhadores por plataforma contribuem para a previdência, a parcela é inferior à média do país tanto no Norte (15,8%) quanto no Nordeste (28,8%) do país. Os índices de Sudeste (36,7%) e Centro-Oeste (36,8%), por sua vez, ficaram acima da média do país.
A pesquisa também mostra a extensão da informalidade entre os trabalhadores por aplicativo. Na média do Brasil, 70,1% das pessoas que trabalham por meio de plataformas digitais eram informais em 2022, ante uma taxa de 44,2% no total dos trabalhadores do setor privado. Trabalhadores que são microempreendedores individuais (MEIs), por exemplo, ficam de fora desse grupo de informais, por serem classificados como trabalhadores formais pelo IBGE por causa da proteção da previdência.
Mais de 80% dos trabalhadores dos segmentos de transporte particular de passageiros e de entregas citam dependência em relação aos aplicativos no que se refere ao valor a ser recebido, aos clientes ou à forma de recebimento do pagamento.
A pesquisa inédita busca medir essa dependência dos trabalhadores, segundo Fontes. Como já apontado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), aponta ele, as plataformas digitais do trabalho com frequência detêm controle sobre a organização e a alocação do trabalho e sobre a remuneração, embora se apresentem apenas como intermediárias entre clientes e os fornecedores individuais, que são esses trabalhadores.
“Apesar de mais de 70% se declararem trabalhadores por conta própria, a pesquisa mostra que havia um grau de dependência da plataforma. Os dados da Pnad Contínua corroboram que os trabalhadores têm autonomia e controle limitados de alguns aspectos relativos ao exercício do próprio trabalho, sobretudo no caso dos trabalhadores plataformizados dos setores de transporte particular de passageiros e de entrega”, afirma Fontes.
Quase a totalidade (97,3%) dos trabalhadores de transporte particular de passageiros disseram que o valor era determinado pelo aplicativo. Entre aqueles de aplicativos de entrega, 84,3% concordaram com essa avaliação. Para os demais tipos de plataformas, a pesquisa apontou os seguintes percentuais: 79,9% para os aplicativos de táxi e 31,9% para os aplicativos de prestação de serviços gerais ou profissionais, como GetNinjas, Parafuzo, Freelancer, Workana e 99freela, entre outros.
Para a maior parte dos plataformizados, também se verificou que o aplicativo determinava os clientes a serem atendidos e a forma de recebimento do pagamento, exceto para aqueles que trabalhavam por meio de aplicativos de prestação de serviços gerais ou profissionais. Assim, o percentual de pessoas que afirmaram que a plataforma determinava os clientes a serem atendidos variou de 35,8% - entre aqueles que utilizavam aplicativos de prestação de serviços gerais ou profissionais – a 87,2%, no caso dos que utilizavam aplicativos de transporte particular de passageiros (exclusive táxi).
Em relação à forma de recebimento dos pagamentos, os percentuais para esses mesmos tipos de aplicativos foram 28,8% e 82,9%, respectivamente; no entanto, o maior percentual desse último indicador foi observado para os trabalhadores em aplicativos de entrega (84,3%).
Os dados da pesquisa apontam ainda para a flexibilidade que muitos citam como uma das vantagens do trabalho por plataformas digitais. A maioria dos trabalhadores concordou que a escolha de dias e horários de forma independente na maior parte dos tipos de plataforma: 83,8% no caso daqueles no segmento de transporte particular de passageiros, 70,8% no caso dos entregadores e 60,6% nos aplicativos de táxi. O menor percentual foi observado nos aplicativos de prestação de serviços gerais ou profissionais (40%).
“Mas a pesquisa mostra também influência na determinação da jornada de trabalho. A forma mais recorrente de influência na jornada tem a ver com incentivos que mudam os preços. A ameaça de bloqueios não foi tão frequente quanto o incentivo, mas chegou a mais de 40% nos motoristas de transporte particular de passageiros e mais de 30% nos entregadores”, diz o analista do IBGE.
Entre as pessoas que utilizavam aplicativos de transporte particular de passageiros (exclusive aplicativo de táxi), 63,2% afirmaram que a jornada de trabalho era influenciada por meio de incentivos, bônus ou promoções que mudam os preços; 42,3%, por ameaças de punições ou bloqueios realizados pela plataforma; e 29,2%, por meio de sugestão de turnos e dias.