O aposentado pelo Regime Próprio pode ser candidato a vereador?

Terça, 13 de agosto de 2024

Passado o período legal das convenções municipais, já se tem a lista de interessados a se candidatarem para o exercício do mandato de vereador no próximo quadriênio.

Dentre os que pleitearão o cargo, tem-se, certamente pessoas que atuam na iniciativa privada, servidores públicos e aposentados sejam do INSS sejam do Regime Próprio.

E, sempre que há aposentados de Regime Próprio, no exercício de mandatos eletivos, surge a dúvida acerca da possibilidade destes virem a ocupar cargos dessa natureza.

A qual é sanada, por intermédio da Constituição Federal que estabelece em seu artigo 37 que:

Art. 37 ...

§ 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.

Permissivo esse que alcança, inclusive, os aposentados por invalidez ou incapacidade, como se depreende do posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça in verbis:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. EXERCÍCIO CONCOMITANTE DO CARGO DE VEREADOR. POSSIBILIDADE. PLEITO DE CUMULAÇÃO DA RENDA PERCEBIDA A TÍTULO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DOS SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO DO EXERCÍCIO DA VEREANÇA PARA CÁLCULO DA RMI DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ART. 18, § 2º, DA LEI 8.213/1991. PEDIDO DE APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 32 DA LEI 8.213/1991. ELEMENTO ESSENCIAL DA NORMA: CONTRIBUIÇÕES DECORRENTES DO EXERCÍCIO DE DUAS OU MAIS ATIVIDADES CONCOMITANTES. HIPÓTESE NÃO VERIFICADA NOS AUTOS. PROVIMENTO NEGADO.

1. A jurisprudência do STJ admite a cumulação da aposentadoria por invalidez com subsídio decorrente do exercício de mandato eletivo, pois o agente político não mantém vínculo profissional com a administração pública, exercendo temporariamente um munus público (REsp 1.786.643/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 21/2/2019, DJe de 11/3/2019).

2. A parte ora agravante pretende que seja aplicado, por analogia, o disposto no art. 32 da Lei 8.213/1991. O uso da analogia pressupõe a ocorrência de lacuna legal e a existência de norma cujo elemento essencial seja análogo ao do caso não regulado; ainda, é imprescindível que dela não se utilize a fim de inserir exceções a regras jurídicas válidas. Ocorre que no caso em questão incide o disposto no art. 18, § 2º, da Lei 8.213/1991.

3. O art. 18, § 2º, da Lei 8.213/1991 admite o retorno às atividades laborativas do segurado aposentado, mas não autoriza que ele receba outra vantagem pelo fato de estar novamente pagando contribuições para a Previdência Social. Essa previsão decorre do caráter solidário do nosso sistema previdenciário. Diante disso, o STF entendeu constitucional a previsão contida no art. 18, § 2º, da Lei 8.213/1991 (RE 661.256/SC).

4. O Ministro Teori Zavascki, ao proferir seu voto no RE 661.256/SC, consignou que "as contribuições efetuadas pelos aposentados destinam-se ao custeio (atual, é bom salientar) do sistema geral de Seguridade, e não ao pagamento ou ao eventual incremento ou melhoria de um futuro benefício específico para o próprio segurado ou para os seus dependentes".

5. E uma vez que o art. 18, § 2º, da Lei 8.213/1991 não faz distinção entre os tipos de aposentadoria, não merece acolhida a pretensão da parte em ver somado o salário-de-contribuição da atividade de Vereador para o cálculo da aposentadoria por tempo de contribuição.

6. Do mesmo modo, não merece acolhimento a alegação da parte de que o dispositivo legal em questão não seria aplicável ao seu caso, já que não estava aposentado quando requereu a aposentadoria por tempo de contribuição. Isso, porque as atividades cujo salário-de-contribuição deseja acrescer foram exercidas enquanto ele estava aposentado por invalidez, de modo que é perfeitamente aplicável o aludido dispositivo legal ao presente caso.

7. O art. 32 da Lei 8.213/1991, que trata do cálculo do salário-de-benefício e da renda inicial da prestação devida ao segurado que exerce duas ou mais atividades vinculadas ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS, é claro sobre ser imprescindível a existência de contribuições concomitantes, provenientes de duas ou mais atividades, dentro do período básico de cálculo.

8. A parte exercia o mandato de Vereador e recebia seus proventos de aposentadoria por invalidez, logo, não há falar em exercício concomitante de atividades sujeitas ao RGPS, tampouco em recolhimento de contribuições em mais de uma atividade.

9. Diante da inaplicabilidade do art. 32 da Lei 8.213/1991, não é devido falar em consideração dos maiores salários-de-contribuição para cada competência.

10. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no REsp n. 1.947.949/SP, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, julgado em 5/6/2023, DJe de 22/6/2023.)

Portanto, a aposentadoria do servidor, ainda que por invalidez, não impede que este venha a se candidatar a vereador.

Publicado em Foco Cidade

Bruno Sá Freire Martins, servidor público efetivo do Instituto de Previdência do Estado de Mato Grosso - MTPREV; advogado; consultor jurídico da ANEPREM, da APEPREV e da APPEAL; pós-graduado em Direito Público e em Direito Previdenciário; professor de pós-graduação; Coordenador do MBA em Regime Próprio do ICDS - Instituto Connect de Direito Social; membro do Conselho Editorial da Revista de Direito Prática Previdenciária da Paixão Editores; escreve todas as terças-feiras para a Coluna Previdência do Servidor no Jornal Jurid Digital (ISSN 1980-4288 - www.jornaljurid.com.br/colunas/previdencia-do-servidor) e para o site fococidade.com.br, autor dos livros DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO, A PENSÃO POR MORTE, REGIME PRÓPRIO – IMPACTOS DA MP n.º 664/14 ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS e MANUAL PRÁTICO DAS APOSENTADORIAS DO SERVIDOR PÚBLICO, todos da editora LTr, do livro A NOVA PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES  PÚBLICOS (editora Alteridade) e de diversos artigos nas áreas de Direito Previdenciário e Direito Administrativo.